Um acordo de longa duração (50 anos) para extrair energia na bacia amazônica, foi firmado no dia 16 de junho em Manaus, pelo presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva e o peruano Alan García Pérez sem discussões suficientes. Sobretudo se for levado em conta que o que está em jogo não é somente a produção de MW (megawatts) e sim o equilíbrio de vastos ecossistemas.
O “Acordo entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República do Peru para o fornecimento de eletricidade ao Peru e exportação de excedentes ao Brasil”, parece viável no papel. No preâmbulo do documento o seu propósito é “avançar em uma integração energética que gere os maiores benefícios para ambos os países”. E esse benefício viria da Amazônia.
O pacote parece completo, mas como assinala Mariano Castro, da Sociedade Peruana de Direito Ambiental (SPDA), “há grandes ausências” nesse Tratado. Tão grandes que na sexta-feira, 18, logo após a assinatura do acordo, instituições ambientalistas levantaram a voz em uma coletiva de imprensa.
As objeções ao Acordo discorrem principalmente sobre dois aspectos: a transparência sobre detalhes dos aspectos ambientais e sociais e a falta de um debate nacional. Desde que os governos peruano e brasileiro firmaram um Memorando de Entendimento em 9 de novembro de 2006, para o estabelecimento da Comissão Permanente em Matéria Energética, Geológica e de Mineração, este tema quase não tem aparecido na mídia.
O Tratado recém firmado estabelece, no ponto “a” do artigo 3, que o Peru se compromete a exportar ao Brasil “no máximo 6.000 MW, mais uma tolerância de 20%”. Ainda assim, Carlos Herrera Descalzi, também ex-ministro de Energia durante o governo de Alejandro Toledo (2001-2006), afirmou existir nos níveis de decisão, “um profundo desconhecimento e um desejo de transcendência”.
Amazônia energética
Os dois principais que de certo modo já estão em andamento e em consonância com o Acordo são o Projeto Inambari, com concessão temporária até junho de 2010, Estudo de Planejamento concluído (faltando o Estudo de Impacto Ambiental) e o Projeto Paquitzapango, com concessão até agosto de 2010 e que não conta com estudos de planejamento. Ambos resultarão em riscos sociais e ambientais.
Inamabari localiza-se ao sudoeste do Peru, na região denominada Madre de Dios, relativamente despovoada e considerada uma das maiores reservas de biodiversidade do mundo. O projeto hidrelétrico a ser construído custará 4.000 milhões de dólares e produzirá 2.000 MW, porém demandará a construção de uma enorme represa que terminaria por inundar pelo menos 40.000 hectares de floresta.
César Gamboa da ONG DAR (Derecho, Ambiente e Recursos Naturales), recordou por exemplo que não se trata somente do gigantesco reservatório – que se converteria na quinta maior da América Latina – como também, de aproximadamente 300km de linhas de transmissão de energia, que desmatariam 6.000 hectares de selva amazônica.
Problema demográfico
View Inambari in a larger map |
Também afetariam os 33 assentamentos humanos de colonos e populações ribeirinhas, as quais já geram crescentes tensões entre a população da área. Parece pertinente a observação de Eresto Ráez, professor da Universidade Peruana Cayetano Heredia, sobre esse tema, “o conceito de energia barata apresentado por alguns funcionários públicos não é intrinsecamente bom”.
As dúvidas aumentam quando se observa os outros argumentos do ex- ministro Herrera Descalzi. O argumento que “o racional” para o Peru seria apelar primeiramente às hidrelétricas das montanhas, que causam muito menos impacto ambiental e dedicar uns anos na exploração do real potencial hidroelétrico do Peru, que não se atualiza desde a década de 70, quando uma missão alemã iniciou esse estudo mas que não o finalizou.
Qual é o problema então? Daniel Cámac, atual vice-ministro de Energia e Mineração declarou que a demanda de energia peruana está crescendo em um ritmo de 8% ao ano e que por isso, “em breve precisaremos de novas fontes de energia”. Insistiu que esse projeto é conveniente para o país porque entre outras coisas, em 30 anos as hidroelétricas construídas pelo Brasil passariam a ser peruanas, como afirma o Acordo.
O documento também assinala que a produção de energia associada às Centrais de Geração, terá como prioridades o mercado legal peruano e o mercado livre peruano e portanto o mercado brasileiro.
Contudo, apesar de mencionar três vezes o termo Desenvolvimento Sustentável, não está claro o interesse prático sobre este conceito e esta prática, nem no momento e sem maiores debates a respeito.
Mais ainda: não é claro no Peru se o Acordo irá ao Congresso, apesar de dispor no artigo 56 da sua Constituição, que os Tratados Internacionais devem passar por esse filtro. Cámac afirmou ao O Eco Amazônia que sim, se enviará. Mas o presidente García quase não tem se pronunciado sobre o assunto, mesmo que pareça claro que a energia irá para o Brasil, mas que os impactos amazônicos se darão em território peruano.
No hay comentarios:
Publicar un comentario