martes, 28 de septiembre de 2010

tensões sobre uma "folha"

A folha de coca deve ser considerada como um elemento territorial de suma importância para diversos povos e comunidade locais da chamada "América Latina", principalmente para os que se encontram na região andina (Colombia, Equador, Perú, Bolívia, Argentina) e amazônica (o brasil e outros países já citados).

Além de sua importância em relação à existência material e soberania alimentar destes povos e comunidades, a folha de coca possui um elemento espiritual e simbólico muito importante nas culturas andinas. Entretanto, tal elemento vem sendo sistematicamente negado e criminalizado pela tal "comunidade internacional" através da sua identificação como "substancia ilícita".

Esta definição da folha de coca como uma "droga" deve ser entendida como uma definição territorial exógena às comunidades locais e povos originários. Conjuntamente com as ações de repressão interna dos estados-nacionais, são ações provenientes das territorialidades verticais das quais nos fala Milton Santos (conferir a pagina "Território" neste blog). São ações que interferem e atacam as tentativas de regulação e atonomia das horizontalidades territoriais destas comunidades e povos.

Nossa equipe que atravesará as regiões andinas deverá estar atenta a estas tensões. Para tanto, segue o link de um artigo sobre as políticas de combate às drogas e a folha de coca, de Johanna Levy publicada no "Le Diplomatique", assim como um pequeno texto que eu produzi chegando em El Alto, Bolívia, em julho de 2009.
Boa Leitura...

"Em favor da folha de coca"

"Ligada à cultura ancestral dos povos andinos e consumida há milênios, ela tem propriedades alimentares e farmacêuticas reconhecidas em inúmeros estudos científicos. Mas o preconceito, as politicas toscas de combate às drogas e as pressões dos EUA querem mantê-la proibida" - (26/05/2008)
disponível em http://diplo.org.br/2008-05,a2390

Respirando [en] el Alto (ou acullicando en El Alto).


   Há mais ou menos 2 horas, llegué al alto, en El Alto, cerca de 4.000 m acima do nível do mar. Estou no districto 8, bairro alteño onde fica a sede da Comunidad Inti Phajsi, a esperar o grupo que esta realizando todos os sabados algumas "visitas" ao hospital infantil onde, vestidos de payazos, vão divertir e animar as crianças que estão no leito deste hospital.

   Enquanto espero fui caminhar até uma das paisagens mais lindas que já conheci: à minha frente e abaixo (uns 500 metros abaixo) se estende um vale que ostenta um pequeno lago. Neste vale se encontra uma comunidade "indígena", ou melhor, original originária, muito antiga (estão lá a mais de 3000 anos), que nem mesmo os colonizadores, nem o Estado, conseguiu desalojar.

   Ao fundo deste hermoso vale, ergue-se de sobressalto os deuses protetores dos andes: Illimani, coberto de gelo e nuvens de tal forma que não se avista seu topo; Morurata com sua cabeça cortada em épocas mitológicas por um Inca, devido seu enorme orgulho de ser o morro mais alto. Dizem que sua cabeça caiu onde agora é o mais novo terceiro morro-deus andino, e símbolo da cidade de El Alto... Wayna Potosi.)

   Ao chegar em El Alto, o primeiro impacto que o meio causa em mim é a falta de ar. A necessidade de mais ciclos respiratórios (inspirar/expirar) para suprir a quantidade de oxigênio que meu corpo esta acostumado... e uma certa dor de cabeça constante como conseqüência da pressão. Espero me acostumar em alguns dias, e ai entra um tema bem controvertido para quem não vive em lugares tão altos ou desconhece a cultura andina: la hoja de coca.

   Primeiramente vale lembrar a diferença entre a folha de COCA e a COCAína. Definida como entorpecente estimulante do sistema nervoso pela OMS (a famosa Organização Mundial da Saúde) e declarada ilegal pela ONU (a degenerada Organização das Nações Unidas) e pela maioria dos Estados Nacionais do mundo, a cocaína é um pó branco utilizado normalmente por vias respiratórias (se cheira!) e possui um alto poder de vício, sendo produzida através do zumo de toneladas de folhas de coca, zumo este processado diversas vezes por produtos quimicos como álcali (solvente orgânico como querosene ou gasolina) e ácido sulfúrico.

   Já a folha de coca por si só é uma planta com reconhecidas propriedades medicinais (como exemplo o "mal de altura"), de forma que seu uso remonta a culturas ancestrais originárias através de chá ou "mascando" um bolo de folhas (acullico). Em momentos de encontro comunitário, em assembléias coletivas, espaços de formação, ensenanza y aprendizagen, esta folha é compartida entre todos presentes, pois seu uso alimenta o debate, seu espirito protege a comunidade... assim, a folha possui um elemento místico e espiritual, sendo usada em rituais e oferendas (não é difícil encontrar no altiplano boliviano yatiris, ou "xamãs", que entre outras, realizam a leitura da sorte com folhas de coca, assim como oferta-la a nossa mãe Pacha).

   Vale destacar também que a folha de coca tem se tornado um símbolo identitário entre os movimentos indigenistas, um símbolo dos povos submetidos à dominação colonial desde a tal "descoberta das índias ocidentais", de instituições e praticas sócio-culturais subjugadas por uma pretensa superioridade euro-americana. É um símbolo de resistência, da luta e da cultura destes povos, de tal forma que no começo deste ano o presidente da Bolívia, Evo Morales Ayma, apresentou uma solicitação à ONU de descriminalização e legalização da folha de coca, através da sua retirada da lista de entorpecentes proibidos pelas convenções internacionais: "A folha de coca não é cocaína, não é nociva para a saúde, não provoca males físicos nem dependência", enfatizou Morales, que, para reforçar sua causa, mascou algumas folhas diante dos ministros dos 53 países membros da comissão

   A ONU sinalizou que irá analisar o pedido, inclusive um estudo efetuado em 1995 pela tal OMS concluiu, com efeito, que "o uso de folhas de coca não parece ter efeitos físicos negativos, podendo ser até que tenha valor terapêutico"... me pergunto se alguem da ONU, ou da tão nobre OMS, se preocupa com o problema de uma outra coca: a COCA-cola?!?!

(El Alto, 25 de julho de 2009) publicado originalmente em http://mirandoelalto.blogspot.com/

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